Cinema e TV: uma parceria que cresce a passos lentos no Brasil

Cinema e TV: uma parceria que cresce a passos lentos no Brasil

 

Por Belisa Figueiró

BELO HORIZONTE – A comemoração do Ano da França no Brasil continua trazendo diversos convidados franceses para eventos nas grandes cidades do país e a Mostra CineBH de 2009 dedicou boa parte de sua programação para aproximar as duas culturas. Na tarde deste domingo, a mesa de debates do seminário sobre as coproduções cinematográficas reuniu especialistas em aliar a televisão e o cinema.

A intervenção do visitante francês Bruno Deloye, um dos diretores do Canal Plus, que iniciou os trabalhos, mostrou como a França tem facilidade para estreitar laços entre as duas janelas, muito à frente dos passos iniciais que as emissoras e produtoras brasileiras estão dando para tentar estabelecer parcerias e coproduções. Lá, a produção dos filmes tem cerca de 28% do orçamento vindo da televisão e, depois de passar pelo mercado de exibição (que tem mais de 5.500 salas em todo o país), esses longas-metragens vão para a TV.

Só o Canal Plus, tem 11 milhões de assinantes e um faturamento anual de 1 bilhão de euros. Dos 200 filmes lançados na França, ao menos 150 tem algum apoio da emissora e o custo médio de cada filme gira em torno de 6,5 milhões de euros. O canal também não fica restrito à exibição de filmes locais. Há espaço também para os “filmes sem fronteiras”, que abarcam aqueles produzidos por países emergentes. Mas essa difusão depende da exibição anterior nas salas francesas e, se for uma coprodução com a França, facilita ainda mais.

Globo Filmes

Cadu Rodrigues, diretor executivo da Globo Filmes, lembrou que o início das operações da empresa impulsionou o market share nacional de 3% a 4% para 12%. O requisito para o sucesso, ou o foco principal para o longa-metragem ganhar o selo, segundo ele, é a qualidade da história. Se for interessante e com chances de atingir um grande público, o roteiro recebe conselhos dos diretores artísticos Daniel Filho e Guel Arraes. Depois, passa para a fase de filmagem e somente nas fases de montagem e estratégia de divulgação é que a Globo Filmes volta a dar palpites, mas sem interferir no corte final, de acordo com Rodrigues. Nos primeiros dez anos, foram coproduzidos 85 filmes dessa maneira.

A partir de “Cidade de Deus” (2002), o foco das produções convergiu para os dramas sociais e acabou saturando o mercado com obras monotemáticas, na avaliação do diretor. “As crianças, o humor e o amor foram esquecidos pelo cinema nacional nos últimos anos”, descreveu Rodrigues. Para a próxima década, ele inclusive adiantou que os filmes infanto-juvenis terão mais espaço na cartela da Globo Filmes, ampliando o leque de oferta.

Questionado sobre a presença maciça das coproduções da Globo Filmes nos filmes que tiveram os maiores públicos da Retomada, Rodrigues disse que gostaria que outras emissoras também investissem mais em cinema porque a Globo Filmes não consegue absorver todo o mercado. “Para cada um ‘sim’, eu tenho que dizer nove ‘nãos’. A Globo Filmes conseguiu se desenvolver, mas o cinema ainda perde para a televisão quanto à inovação de formatos diferenciados. Hoje a televisão arrisca mais”.

TV Cultura

Gabriel Priolli, coordenador do Núcleo de Conteúdo e Qualidade da TV Cultura de São Paulo, levantou a discussão sobre a falta de recursos públicos na emissora e o quanto isso determina a dependência dos índices de audiência, com prioridade para formatos que atinjam um público maior. Hoje, segundo ele, apenas 30% da verba do canal são provenientes do Estado. “O ideal seria 100%. Com isso, teríamos uma programação para diversos nichos. Mas nós dependemos da audiência. Infelizmente, no Brasil, é assim”.

Apesar das limitações, Priolli lembrou que a programação da TV Cultura inclui a exibição de um longa-metragem brasileiro por semana, somando 52 no final do ano, sem contar os curtas e médias-metragens. As coproduções do canal com as produtoras independentes cresceram muito nos últimos três anos. Só em 2009, já foram 13 médias-metragens de documentários.

E essa parceria com produtores de fora, na opinião dele, é uma tendência e funciona para aumentar a diversidade, embora sempre seja discutido o formato para grandes públicos, como documentários narrados, por exemplo. Por meio do Fundo Setorial do Audiovisual, a emissora saiu na frente e tem planos de aumentar as coproduções não só com os produtores de São Paulo, mas com os do país inteiro.

Canal Brasil

Nessa linha, o diretor-geral do Canal Brasil, Paulo Mendonça, também salientou a grande quantidade de filmes que o canal vem coproduzindo com produtoras independentes nos últimos dois anos. Ao todo, já são 17 filmes, a exemplo de “Loki”, que também conquistou grande público nos festivais e teve boa audiência na emissora. A partir de novembro, muitos desses filmes começarão a chegar nas lojas, em DVD. “Conseguimos motivar uma sinergia com parceiros para poder coproduzir. Depois de sair do vermelho, finalmente o Canal consegue expandir suas atividades, não só de exibição”, comemorou.

Para fechar, o coordenador de TV e Plataformas Digitais da Secretaria do Audiovisual, Octavio Pieranti, ressaltou que os canais públicos são os maiores parceiros dos produtores independentes. O programa DocTV, ele exemplificou, já soma 170 documentários exibidos em TV aberta e é uma celebração da parceria do cinema com a televisão. Questionado se o Estado não deveria interferir para que outras empresas de televisão fizessem concorrência à Globo Filmes, ele afirmou que não é papel do governo estabelecer se a empresa A deve fazer A filmes ou se a B deve fazer B filmes. O que deve ser fomentado, segundo ele, são os novos modelos de coprodução.

Amanhã, segunda-feira, o seminário segue debatendo o tema com foco no mercado audiovisual e as políticas públicas para o setor no Brasil e na França. Veja a programação completa do festival neste link.