Por Luís Nogueira
Não descurando, necessariamente, a importância do som no cinema, a verdade é que a visualização é, em muitas instâncias e para inúmeros criadores, a operação fundamental da sétima arte. Visualizar significa conseguir transformar ideias – sejam elas narrativas, temáticas, formais, etc. – em imagens (no que nos importa, cinematográficas). Para cumprir esta tarefa não existe um método ou um conjunto de procedimentos universais e infalíveis. À partida, temos para cada autor ou artista uma forma de fazer. No entanto, existem ferramentas e dispositivos, quer discursivos quer técnicos, que podem ser partilhados e usados com benefício por todos.
A planificação e a montagem são duas diligências fundamentais daquilo que se poderá chamar de linguagem cinematográfica. E a découpage e o storyboard são ferramentas muito úteis para operar a este nível. No entanto, devemos afirmar, mais uma vez, que é perfeitamente viável (e muitas vezes imprescindível) recusar ou negar estas ferramentas.
Em muitas circunstâncias é contra as normas e os procedimentos que se consegue ser criativo. Contudo, não conhecer as ferramentas nem os procedimentos à nossa disposição poderá ser mais do que negligência. . . e extremamente nefasto.
Temos, portanto, a planificação e a montagem como dois momentos decisivos da criação cinematográfica. Em princípio, trata-se aqui de pensar um plano na sua autonomia e valor próprios, por um lado, e na sua articulação com os demais planos e os seus significados latentes, por outro. Como método, de certa maneira, devemos começar por fazer corresponder cada plano a uma acção ou a uma ideia.
Um plano tem sempre uma justificação, mesmo que esta seja aparentemente oculta. Ele resulta de uma ou várias escolhas, mesmo se inconscientes. Se se trata de uma obra narrativa, convém conhecer os momentos decisivos da história, perceber a importância da clareza e da continuidade do discurso, entender a relevância dramática de uma imagem. Se se trata de uma obra experimental, convém perceber as incidências formais do plano, a sua autonomia, o seu tempo, a sua densidade. Entre outras coisas.
Em qualquer caso, devemos necessariamente pensar a composição do plano, a perspectiva que oferece, as proporções que estipula, as hierarquias que instaura, pois o que aparece numa imagem não deve ser indiferente. Há questões de escala, questões de profundidade, questões de associação e justaposição. E de articulação: a montagem introduz novos níveis de complexidade para as imagens, outros sentidos, outras verdades, até certas mentiras. Em todo o caso, e de qualquer modo, são sempre ideias que são colocadas em jogo no cinema, através da planificação e da montagem, como através dos movimentos das personagens ou da câmara.
Podemos ainda pensar na relação entre palavras e imagens, entre ideias e objectos, entre o abstracto e o concreto. Para todas estas operações intelectuais – exigentes como o são – a planificação e a montagem, dependendo dos géneros e dos estilos, das tradições ou das subversões, oferecem as condições necessárias para um discurso cinematográfico abrangente e exigente. É disso que se fala a seguir. E de alguns utensílios apropriados para o conseguir.
FICHA TÉCNICA
Título: Manuais de Cinema III – Planificação e Montagem
Autor: Luís Nogueira
Colecção: Estudos em Comunicação
Ano de edição: 2010
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