Por João Paulo Rodrigues Matta
Entre os anos cinqüenta e sessenta do século XX, a indústria cinematográfica passou a ser vista como uma vertente de uma cadeia mais ampla e ramificada, compondo com a mídia televisiva, a conformação inicial da indústria audiovisual. Esta transformação estrutural na dinâmica produtiva do cinema fez com que se ampliasse a importância competitiva do elo da distribuição.
Com a evolução tecnológica ao longo das décadas subseqüentes, este processo intensificou-se, surgindo outros formatos de produção e plataformas de exibição audiovisuais. Desta forma, atualmente a dinâmica competitiva da indústria cinematográfica, em geral, envolve a produção e distribuição de filmes para serem exibidos, inicialmente, nos cinemas e, posteriormente e de forma gradativa, em diferentes janelas de exibição, como a televisão aberta, a televisão por assinatura, o vídeo e as mídias digitais (DVDs, transmissões via internet, telefones celulares).
A eficácia das políticas públicas de apoio à indústria cinematográfica depende da observância e compreensão da evolução da lógica estrutural de sua cadeia produtiva. Neste sentido, não se pode deixar de reconhecer a efetividade da atuação do governo dos EUA. Para que se consumasse a integração entre cinema e televisão, por exemplo, foi capital a regulamentação da Federal Comunications Comission (FCC), que até 1993
proibiu as redes de televisão de consumir e distribuir mais de 30% de seus próprios programas. Com este dispositivo, o governo norte-americano estimulou a convergência entre as duas mídias.
Para Neves (2003b), uma das explicações para a consolidação da hegemonia mundial dos EUA no século XX foi o país ter originado e assimilado antes que qualquer outra nação os parâmetros de desenvolvimento da economia contemporânea. Desse modo, a
sociedade da informação desenvolve-se nos EUA, com a convergência das indústrias do audiovisual, de telecomunicações e de tecnologias da informação e comunicação.
Este movimento de convergência teria sido selado por Hollywood, ao “[…] integrar as teletransmissões e os serviços informáticos com seus ‘conteúdos’ [produção cinematográfica e televisiva], o que permitiu satisfazer um novo mercado, ‘de base eletrônica’, de divertimento” (NEVES, 2003a, p. 90).
Políticas públicas de apoio à indústria cinematográfica para serem eficazes precisam ter como premissa que essa cadeia produtiva está imersa numa lógica mais ampla,compondo a complexa e dinâmica rede de relações econômicas que perfazem a indústria audiovisual. A indústria de produtos e serviços audiovisuais organiza-se em cadeias independentes e inter-relacionadas que abarcam três etapas: produção, distribuição e exibição, e envolvem grandes conglomerados econômicos (majors), organizações de porte intermediário e, também, inúmeras pequenas firmas e profissionais especializados em diversos ramos produtivos.
A diversidade dos meios que constituem esta cadeia vem sendo impulsionada pela evolução tecnológica que além de multiplicar as alternativas de produção, também vem possibilitando o surgimento e o aperfeiçoamento de diferentes plataformas de exibição, assim como transformações na lógica de atuação da distribuição. A estrutura geral da cadeia produtiva audiovisual e a descrição de suas principais categorias de produção estão ilustradas na Figura 1. Nela se pode constatar o alto valor comercial do produto “cinema”, único a atingir todos os principais mercados de exibição.
No Brasil, acredita-se que as políticas públicas federais de apoio ao cinema aplicadas ao longo da história têm se mostrado ineficazes por serem estruturalmente equivocadas para a indústria. Ao não trabalharem o elo da distribuição e não provocarem a convergência entre a produção cinematográfica e os demais ramos da cadeia audiovisual nacional, tais políticas não têm conseguido promover a contento o desenvolvimento da
indústria cinematográfica brasileira.
O objetivo deste artigo é apresentar um breve histórico das políticas públicas federais de apoio à indústria cinematográfica brasileira, discutindo sua eficácia na distribuição e, conseqüentemente, no aumento da performance competitiva dos filmes brasileiros no mercado interno. Para isto, na seção que se segue a esta introdução, discorrer-se-á sobre
as políticas adotadas até a instauração da ditadura militar no Brasil. Em seguida, serão abordadas as iniciativas levadas em curso após o golpe militar, destacando-se a atuação da Empresa Brasileira de Filmes (EMBRAFILME). Na seqüência, serão comentadas as
políticas públicas que possibilitaram a retomada da produção cinematográfica nacional, a partir de meados dos anos noventa até o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (Lula).
Leia o estudo na íntegra.